Campus Aquático de Montemor-o-Velho sob suspeita, auditoria forense avança em breve

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A última Assembleia Geral (AG) da Federação Portuguesa de Natação (FPN), realizada no passado sábado em Viana do Castelo, ratificou a decisão da auditoria forense ao Campus Aquático de Montemor-o-Velho, inaugurado em 2011 pelo então presidente Paulo Frischknecht.

A auditoria forense, muito em voga nos últimos tempos, é uma ferramenta ligada à contabilidade que pretende esclarecer se houve a ocorrência de crimes e atos ilícitos.

No caso em concreto, as contas do imóvel em Montemor-o-Velho, que ainda hoje pesam no orçamento da FPN, serão passadas a pente fino.

Afinal o que está de errado ou não nas contas do contrato de promessa de compra da propriedade?

Numa análise ao relatório e contas de 2011 da FPN, a mesma entidade teve que desembolsar, como sinal, 179.053,50 euros. Até março de 2016, o organismo federativo teria que proceder ao reforço dessa verba no montante de 148.792,50. No momento da escritura, o valor a desembolsar para a compra do imóvel seria de 538.638,87, o que perfaz um total de 866.484,87 euros.

O contrato foi celebrado com a empresa ITMOV Lda, cujos sócios-gerentes são Jorge Luís Forte Camarneiro e Yury Velichko, respetivamente, presidente do Conselho de Administração e vogal da IT – Comércio Internacional, empresa-mãe da ITMOV, Lda.

O Campus Aquático, cuja obra foi comparticipada em 130 mil euros pelo Proder – instrumento estratégico e financeiro de apoio aprovado pela Comissão Europeia –, foi inaugurado a 16 de abril de 2011 com pompa e circunstância com a presença do secretário de Estado da Juventude e Desporto, Laurentino Dias, que considerou que os jovens atletas tinham ali à sua disposição “todas as condições para evoluírem nas carreiras desportivas e académicas”, exortando-os a lutarem pelos “melhores resultados”.

Por sua vez, o presidente da edilidade, Luís Leal, realçou a importância desta nova “casa da natação” e ligou esta “simbiose da ruralidade e da criatividade” à “cumplicidade” de Laurentino Dias, a quem apelidou de “Cidadão de Montemor”.

Por outro lado, o então presidente da FPN, Paulo Frischknecht, considerou que o equipamento era “um orgulho da natação” e agradeceu a possibilidade do lançamento do novo “Hotel de quatro estrelas”, esperando que o mesmo tivesse capacidade de “retorno”. Enganou-se. Não teve retorno e os custos com o tal “Hotel de quatro estrelas” ditaram a desistência da compra do imóvel cerca de dois anos depois, já com o novo presidente da FPN, António José Silva.

Voltemos a 2011. O Campus Aquático de Montemor-o-Velho estava inserido no Centro Nacional de Preparação Desportiva de Natação (CNPDN) e funcionava em regime de internato. O acesso prioritário estava destinado aos praticantes das disciplinas de águas abertas e natação pura.

Situado na proximidade dos equipamentos a utilizar para treino, nomeadamente o Centro Náutico e a Piscina Municipal –, o Campus Aquático era composto por 12 quartos, uma cozinha, uma sala de refeições, uma lavandaria, uma sala de convívio, uma sala de reuniões, dois gabinetes técnicos e duas salas de fisioterapia.

Estava devidamente equipado de modo a poder receber, em condições de conforto e funcionalidade, até um máximo de 32 pessoas. No primeiro ano, permaneceram apenas seis atletas (2 de águas abertas e 4 de natação pura), tendo desistido um.

A 19 novembro do mesmo ano, a aquisição do imóvel onde se situa o Campus Aquático de Montemor-o-Velho foi aprovada em Assembleia Geral da FPN com 17 votos a favor e uma abstenção por parte do delegado Simão Morgado, em representação do Nadadores Portugueses Associados, o único a colocar dúvidas sobre o negócio.

Após o adiantamento de mais 35.010 euros em 2012 (acumulado de 214.063,50 €), as eleições para os órgãos sociais da FPN realizaram-se nesse ano em dezembro, registando-se um empate entre as listas encabeçadas por Paulo Frischknecht e António José Silva.

Um segundo ato eleitoral foi realizado em janeiro de 2013 com o triunfo a pertencer a António José Silva.

2019-03-26 (4)

A Direção liderada pelo novo presidente levou o dossier do Campus Aquático à Assembleia Geral, realizada a 21 de julho, e os delegados ratificaram a decisão da Direção de “resolver, por via extrajudicial e por acordo recíproco das partes, o contrato promessa de compra e venda do imóvel onde se situava o Campus Aquático, em Montemor-o-Velho, mediante a devolução, pela entidade promitente vendedora, da quantia equivalente a metade da quantia liquidada pela FPN, a título de sinal e no âmbito mencionado contrato promessa, devolução essa a efetivar de forma parcelar até ao final do mandato previsível da atual Direção (Dezembro de 2016)”, lê-se no relatório e Contas da FPN de 2013.

“Em termos contratuais, a Federação está vinculada por contrato promessa de compra e venda com a entidade Itmov, Lda. tendo por objeto a compra de um imóvel em Montemor-o-Velho onde funcionou até 30 de junho de 2013 o “Campus Aquático” da Federação. A partir dessa data, a FPN cessou a ocupação do referido imóvel, bem como a pagamento das quantias a que estava contratualmente obrigada por força do referido contrato”, lê-se ainda no mesmo documento.

Procedeu-se, segundo o mesmo relatório, ao adiantamento por conta de investimentos no valor de 17.505 euros, passando a um acumulado de 231.568,50 €.

O mesmo documento indica que, a “a 31 de dezembro de 2013, a Federação tinha responsabilidades futuras com a aquisição de imobilizados, no montante de 634.916,37 euros (2012: 652.421,37 euros), respeitantes ao investimento em curso para aquisição do imóvel em Montemor-o-Velho”.

O Relatório e Contas de 2014 refere que “a Federação encontra-se a dirimir uma tentativa de resolução extrajudicial que não onere as partes junto da sociedade Itmov, Lda., esperando-se a sua conclusão durante o ano de 2015, nomeadamente a resolução do referido contrato promessa de compra e venda sem quaisquer consequências negativas relevantes para a Federação”.

Tal não veio a verificar-se como consta no Relatório e Contas de 2015: “À presente data, não foi ainda possível resolver esta situação pelo que a Federação encontra-se a dirimir uma tentativa de resolução extrajudicial que não onere as partes junto da sociedade Itmov, Lda., esperando-se a sua conclusão durante o ano de 2016”.

O mesmo veio a acontecer em 2016, não se tendo chegado a qualquer acordo entre as partes.

Em março de 2017, ficou acordado que “a Itmov, Lda irá devolver metade do valor que a FPN pagou a título de sinal, até ao final do mandato da atual Direção, ou seja, até ao final do ano 2020”, lê-se no Relatório e Contas da FPN desse ano.

“Com este cenário afetou-se aos fundos patrimoniais o impacto da devolução de apenas 50% do valor do sinal pago à Itmov, Lda, ou seja 115.784,25 euros”, refere o mesmo documento.

Após análise ao Relatório e Contas de 2018, aprovado no passado sábado, não houve ainda qualquer verba devolvida pela Itmov, Lda. à FPN.

Em breve será iniciada a auditoria forense que pretende dissipar todas as dúvidas envoltas de um negócio no mínimo suspeito.

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